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CAFÉ EXPRESSO

"A minha frase favorita é a minha quando me sai bem"

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"A minha frase favorita é a minha quando me sai bem"

HETEROSSEXUALISTAS, GAYS E TIROS NO PÉ


Tita

13.08.12

 

 

 

Uma lésbica colocou no seu mural do Facebook uma fotografia de um homem e uma mulher perfeitos no estilo estilizado frozen Photoshop a preto e branco. Ele como que caia por cima dela e beijavam-se. Tudo sem paixão, como é típico nesta espécie de arte fotográfica corriqueirinha. A autora do post legendou a foto com um sintético mas comprometido “love it” (e se não fosse em inglês é que eu me admirava).  

 

A questão é: “love it” o quê e foi postado para que efeitos? 

 

Fiquei imediatamente com uma ideia mas para cabal esclarecimento fui ver murais de heterossexuais amigos. Homens e mulheres. Não havia. Nuns e noutros nada de homens a beijar homens ou mulheres a beijar mulheres.  Bom, de volta ao mural dela pensei: “Quem entra aqui há-de ter a certeza, se a ideia lhe ocorrer, que esta mulher é heterossexual. E esta fotografia ajuda. Mais, esta fotografia está aqui para isso”.

 

Sim. Uma vez que se trata de uma mulher adulta, estamos a falar de uma hipócrita. Porém, tão hipócrita como heterossexualista e, por consequência, homofóbica. Se não achasse bonito, não tinha postado. E se não fosse gay, o mais natural era não postar.

 

Independentemente da orientação, e sem nada ter a ver com ela, existe no ser humano a consciência ou a inconsciência do ser heterossexualista. Ser heterossexualista é guardar na memória o desiderato do processo de transmissão da cultura pela família e pela sociedade sobre o individuo, o qual com o processo de maturação pessoal só tende a consolidar-se. Um desiderato que se pode sintetizar na seguinte ideia: “a união física, emocional e romântica de duas pessoas de sexo diferente é que está bem. Por ser a mais correta no contexto social; por ser a que potencialmente melhor lhe serve a organização e por ser a que mais satisfaz as exigências da estética quando chamada (própria ou impropriamente) a este tema”.

 

Portanto, os heterossexuais são heterossexualista, os homossexuais também, e bem assim os bissexuais.  Todos nós, independentemente da orientação. E como tal, embora em diferentes graus (em função da inteligência, sensibilidade e maturidade), homofóbicos.

 

E se isto corre em geral bem para os heterossexuais e umas vezes melhor outras vezes pior para os bissexuais (que, naturalmente, acabam quase sempre a assumir a sério a suas relações com o sexo oposto), é capaz de ser quase trágico para os homossexuais, dado o evidente conflito.

 

Um conflito entre uma convicção involuntária na sua génese mas enraizada pelo tempo e a forma própria humana de ser de cada ser gay. Isto é um golpe na estabilidade e na autoestima. Com isto dá vontade de não ser homossexual. Daí a homofobia ser eventualmente maior nos gays do que nos heterossexuais. Porque só os gays sofrem direta e diariamente as dores emocionais e psicológicas deste conflito. E que eu saiba ninguém aceita pacificamente que tenha nascido para sofrer.

 

Sabe-se que, em geral e independentemente do tempo que leva a ir “levantar a carta aos correios” (que podem ser longos anos), o individuo dá conta da sua homossexualidade bastante cedo. Logo na infância ou, um pouco mais tarde, na adolescência. Não admira pois que surjam disfuncionalidades de vários tipos. Porque não é fácil para as pessoas. Especialmente se são “apanhadas” em estágios tão incipientes da sua formação emocional e mental.

 

Na verdade, até hoje, e malgrado os progressos políticos, legais e sociais alcançados, os gays (homens ou mulheres) ainda não lograram desembaraçar-se totalmente das ideias do ridículo, da hipocrisia e da automarginalização. Ou é o estereotipado que envergonha e/ou faz rir (até os próprios gays não estereotipados). Ou é o dissimulado que finge não ser o que é. Ou/e é o autoexcluído emocional que vive a sua intimidade em parques públicos à noite ou casas de banho de centros comerciais a qualquer hora do dia

 

No caso concreto, é a lésbica que "love it".

 

 

5 comentários

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    Tita 14.08.2012


    Sara, se te chamei não foi por mal. O texto diz isso mesmo. Somos todos heterossexualistas. É da educação, como está no texto. Mas não te chamei hipócrita de certeza, como no exemplo dado.
    Obrigada pelo video.
  • Sem imagem de perfil

    Sara 14.08.2012


    Sim. Hipocrita eu não sou e isso tu sabes bem.
    Mas tb não referi o assunto por ter ficado minimamente ofendida... nós na altura discutimos o assunto degladiamo-nos e suponho que acabamos a rir... como aconteceu com muitas conversas que tivemos em que não concordavamos uma com a outra (pelo menos aparentemente).
    REferi-o apenas porque o texto me fez voltar a essa nossa conversa.
  • Sem imagem de perfil

    Catarina 14.08.2012

    Sara, se me permites e uma vez que cat2007 não tem de momento flashplayer ou tempo, aproveitava para alargar o debate não forçosamente a mais pessoas mas no sentido de ir mais longe, penso que é o que este post faz. E não o faz por mim, por ela, por ti ou pela lésbica do mural do facebook que é dada apenas como ponto de partida. Vai mais longe para todos, independentemente da orientação sexual ou do credo religioso.

    Eu tenho flashplayer e vi os 4.07 minutos do discurso da tal "mulher heterossexual" que sugeriste.
    O discurso é absolutamente pacífico e não creio que alguém ouse discordar do que ela diz, ou se discorda tenta calar-se se tiver o minimo bom senso.

    Este post reitera esse discurso indo mais longe. Porque será que há uma fotografia de duas mulheres de burqa? Porque será que à primeira vista pensamos, era o que faltava se, por exemplo, eu lésbica não podia pôr no mural do facebook uma fotografia Straigt. E mais, pensamos !ei! eu sou lésbica e assumidissima e não me sinto heterossexualista. E o post avança mais ainda. Primeiro a ideia de que o inferno(implícito no discurso da atriz) são os outros, aqueles que nos discriminam. Não são. O inferno começa sempre em nós(todos) e ser heterossexualista não é uma opção que se toma. É uma subtileza em pequenos atos e ditos quotidianos de nós todos que crescemos num modelo de sociedade heterossexalista, mesmo aqueles que são irmãos e irmãs de gays...como a atriz.

    É muito mais do que a igualdade de direitos que está a qui em causa. Estamos todos nós com os nossos conflitos interiores. De quando damos 1 passo em frente e 2 atrás. De quando nos convencemos que somos suficientemente transparentes para criticar a burqa de outra mulher, ou de duas mulheres no caso da fotografia.

    Há imenso para dizer sobre este post quando conseguimos sair do nosso "so private world" ainda que o levemos sempre em conta.

    E agora uma confissão: neste blog há posts que eu considero despertadores de consciência. lamento sempre que outras(ou as mesmas) consciências não venham aqui para contrariar, argumentar, avançar e recuar até á zanga e ao riso e aquém e além da 1ª pessoa do singular.
    Parecem-me sempre posts de fogo fátuo, uma chama que surge com a mesma rapidez com que se apaga e tb o digo à sua autora, claro está. E de certeza que nada disto tem a ver com um blog ter ou não ter audiência ou visitantes. 

    tudo isto traduzido, resume-se a uma pergunta com um ar desanimado: mas Sara, deste post todo com direito a burqa e tudo, só deu para um video de 4.07 de uma mulher heterossexual? mas a gente já sabe que as mulheres heterossexuais amam gays, whats new? please please say more things, more more ;)

    criei uma expetativa com este post. mais um fogo fátuo.(eu desiludida):
    Image


     
  • Sem imagem de perfil

    Sara 15.08.2012

    2.

    Mas existem situações no seio da dita comunidade gay que me incomodam muito mais:


    - Aqueles que sabem que são, mas o sentem como uma doença ou adição a ser combatida com todas as suas forças;


    - Aqueles que, por vergonha de admitirem as suas limitações, assumem a sua gayzisse não deixando de se sentir culpados e tentando camuflar a sua “anormalidade”. O exemplo apresentado pela Cat2007 demonstra essa situação. (a propósito disso lembro-me de uma conversa de metro com dois colegas (1 homem e 1 mulher, ambos gays) em que o rapaz dizia que a sua primeira experiência com um homem tinha sido de tal forma traumática que após o ato chorou (de tristeza) durante horas. Ela concordava e dizia que lhe tinha acontecido a mesma coisa a primeira vez que esteve com uma mulher. Eu olhava para eles como se fossem marcianos, e só pensava o quanto me parecia ridículo. Eu tinha-me sentido fantástica. Tinha-se feito luz. Era mesmo aquilo!)


    - Aqueles que assumem publicamente a sua tendência, a sua relação, põe a etiqueta na testa e acenam com a bandeira, mas depois se tentam manter fiéis aos padrões sociais que conhecem, reproduzindo papéis de masculino e feminino estandardizados (o macho e a fémea, o ativo e o passivo, o dominante e o submisso, a sopeira e o canalizador).

    Continua no comentario seguinte


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