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CAFÉ EXPRESSO

"A minha frase favorita é a minha quando me sai bem"

CAFÉ EXPRESSO

"A minha frase favorita é a minha quando me sai bem"

AZUL - Cap LXXIII


Tita

24.10.16

Depois de falar, Teresa sentiu que, apesar de se ter dirigido a Madalena, foi como se não estivesse a falar para ela. Pronunciou-se como se estivesse a tratar de um caso em abstrato. Nem se sequer lembrou de ponderar pedir o perdão que Madalena tinha solicitado minutos antes. E foi neste momento que se deu conta de que, desde que aquele jantar começara, em nenhuma ocasião se tinha solidarizado com Madalena. Pelo contrário, lançou-lhe algumas ironias e instalou deliberadamente um certo distanciamento. Começou então a sentir-se desconfortável com esta postura. Porque indiciava já alguma falta de consideração. Assim, aproximou-se dela. Pegou-lhe na mão e puxou-a suavemente em direção à sala pequena. Madalena seguiu-a docilmente.

Teresa: Vamos todas tomar café na sala pequena. Não é melhor?

Clara: Sim é mais confortável.

Teresa e Madalena sentaram-se no sofá castanho de dois lugares, embora não próximas. Joana ficou no cadeirão bege à esquerda, distanciando-se assim um pouco. Clara quedou-se de pé com a pequena chávena na mão.

Clara: Como lhe disse, mãe, creio que elas têm razão. Portámo-nos como duas sociopatas. E por isso, sem querer arranjar justificações para algo que não foi bem feito, desejo dar uma satisfação à Joana. Porque me importo com ela. Se ela desejar ouvir.

Joana: Preciso mesmo de ouvir.

Clara: Em primeiro lugar, é preciso sublinhar que a crise de que falávamos foi proporcionada pela enorme rotura que sucedeu entre mim e a minha mãe. De início, essa rotura deixou-me tresloucada. E depois apática e indiferente. A verdade, é que a minha mãe me apareceu à frente com outras vestes. Em trajes de mentirosa. Da maior mentirosa que eu conhecia na vida. E se eu a amava também por acreditar que ela era uma pessoa autêntica. Uma mulher de caráter. Que dizia sempre a verdade… enfim. Isto vocês já sabem. Para o que importa, eu fiquei desalentada e cai numa prostração que me atirou para dentro do meu quarto com desejos íntimos de não mais dali sair. Portanto, eu fiquei doente. E, assim doente, pensava também muito na Joana. Mas pensava essencialmente que seria muito justo que ele me estivesse a odiar. Era o que eu podia esperar, atendendo à forma como a tratei. Lembro-me que ela nem sequer lutou contra mim quando eu lhe lancei aquele amontoado de loucuras em cima. A Joana simplesmente foi-se embora naquela altura sem dizer palavra. Considerei que seria muito lógico que ela me tivesse começado a desadorar. Sabia que ela sofria. Não queria que sofresse mas sentia que já não podia fazer mais nada. Só quando o meu organismo reagiu e se solevantou é que foi possível falar com a minha mãe. E, entre outras coisas fundamentais de que falámos, ela fez-me ver que a Joana me perdoaria, assim eu lhe pedisse perdão. Foi o que fiz.

Respirou fundo.

Clara: Desculpa, Joana. Não fui capaz de fazer melhor.

Joana: Obrigada. Tinha uma espécie de alfinete muito pequeno a espetar-me o peito. Já te tinha perdoado. Mas havia de facto esta dor fina a apoquentar-me.

Clara: Que passou?

Joana: Passou.

Clara: Madalena, não se desengrace comigo. Eu já não embirro consigo. Peço-lhe desculpa. Creio que me precipitei. Tem razão quando diz que ainda me falta crescer um bocadinho.

Madalena: Creio que vai chegar lá depressa. Não se preocupe.

Clara: Mãe, eu e a Joana já não temos nada a fazer aqui. Vamos para o meu quarto. Porque este é já só o vosso momento. Vens, Joana?

Joana: Vou.

Clara estendeu-lhe a mão num sorriso e sobalçou-a do cadeirão bege. Foram.

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