RUMO AO SUCESSO
Tita
24.03.07
Sinto o impasse. Algo me espera e eu, cansada pela turbulência alegre de parque de diversões que há-de vir, estou aqui parada num descanso antecipado do meu sucesso. É por isso que não tenho vontade de sair para a noite e beber uns copos. Não se pense ou veja o sucesso como o sucesso. Aquele sucesso que sucede a alguma conduta nossa e nos torna famosos ou, pelo menos, bem sucedidos no sentido habitual do termo.
Espera-me o sucesso. Vou passar por cima das pedras e chegar ao cimo de algum lugar. Ou vou descer por elas e encontrar um recanto desconhecido de todos. Ou, então, vou guardar todas as pedras que encontrar no caminho. Guardá-las com as que já recolhi e, depois, vou construir um castelo. O meu castelo. A minha vida. Não como fez Fernando Pessoa. Uma obra inacreditável.
As minhas pedras são marcos e, concomitantemente, pontos de referência para o futuro. É verdade que as guardo. Mas não as arrumo ordenadamente em qualquer lugar por mim pré-determinado. Elas ajeitam-se sozinhas por onde querem na minha vida. Só mais tarde as poderei tomar. Mais tarde, depois deste impasse. Nesse dia começarei a construir o meu castelo. As pedras, o caminho e o castelo são, de facto, realidade que se me confundem.
Ando a tentar compreender o que quero através das pedras. O mundo está cheio delas. Não percebo porque razão só se usam pedras para a construção civil ou para alimentar ilusões e angústias nos gabinetes dos que se fingem magos. Não estou a prever o meu futuro e não acredito em adivinhos de carne e osso.
Acredito no vazio angustiado dos espíritos egocêntricos que só querem saber como anda a sua vida amorosa, a sua saúde ou o dinheiro. Problemas que lhes suscitam as leituras da literatura cor-de-rosa.
Acredito, pois, na Tertúlia cor-de-rosa, na SIC de manhã e na astróloga Maya que sabe tudo sobre as pessoas que aparentemente já conquistaram o que desejam na vida.
Acredito nos intriguistas porque são demasiado cobardes. A cobardia nota-se no cheiro. Acredito nos invejosos porque não conseguem resistir à intriga. Acredito nos medrosos porque são cobardes. Acredito nos incrivelmente vaidosos porque são egocêntricos. Acredito no povo faminto de atenção e ternura, comendo umas sardinhas, e olhando com devoção para umas lagostas suadas porque não as quer comer.
Acredito nos impostores porque Hollywood é o centro do universo. Acredito no Vaticano e no Papa porque todas as pessoas de bom senso usam preservativo e em África se morre com Sida, de acordo com a fé da Igreja. Acredito na Opus Dei porque José Maria Escribá já é um santo. Acredito na política porque não lhe percebo o discurso e vejo obedece à lei das pás do moinho (umas vezes em cima, outras em baixo), sendo as caras sempre as mesmas em sensatas alternâncias.
Acredito na estupidez humana porque falta sentido crítico e o George W. Bush é o homem mais poderoso do mundo. Acredito na globalização e no excesso de liquidez porque há muita fome no mundo.
Por enquanto, ainda acredito em mim. Até passar o impasse.