QUEM PAGA O ESTADO AO ESTADO?
Tita
08.05.12
As famílias que têm rendimentos para mandar os filhos estudar para colégios caros e que frequentam quase exclusivamente os serviços de saúde privados não deviam poder deduzir as respetivas despesas no IRS. Mais, quem pode comportar este tipo de despesas, caso pretendesse aceder aos serviços públicos de saúde e de educação, deveria pagar de acordo com os preços do mercado.
Era nisto que eu andava a pensar nos últimos tempos. Reflexões que têm obviamente a ver com a atualíssima questão da necessidade de emagrecer o Estado, reduzindo drasticamente os seus gastos. Um problema que já não é novo. Começou a ser grave aquando do primeiro choque petrolífero dos anos setenta do século XX, ficou pior com o segundo choque nos anos oitenta e agora está na sua fase mais aguda por virtude das crises orçamentais dos países da zona euro.
Pois, dá ideia que estamos a falar da evolução de um cancro. E até parece que o Estado Providência está definitivamente condenado. Não duvido nada que esteja no seu modelo tradicional. Aquele a que nos habituámos. Em que o Estado dá para todos e paga a todos. Ricos, pobres e remediados. Basicamente com as receitas provenientes dos impostos o Estado constrói estradas, caminhos-de-ferro e aeroportos, escolas, hospitais, lares e jardins-de-infância, além de que assume os custos de formação dos profissionais e as despesas com a saúde das populações. É assim desde que, em meados do século passado, foram reconhecidos a todos os cidadãos os chamados direitos sociais e económicos.
Creio que resulta óbvia a irracionalidade do sistema. Qualquer um compreende a insustentabilidade do modelo. Desde quando é que as receitas dos impostos cobrem responsabilidades desta dimensão? Exato. Não cobrem, pelo que os défices orçamentais se vão expandindo. Assim, creio que os direitos sociais têm de ser comprimidos. Não na sua dimensão interna mas nos limites da sua abrangência.
Os direitos sociais, entre os quais se destacam a saúde e a educação, são direitos de proteção económica. Por definição devem, então ser reconhecidos a quem tem de ser protegido. A questão está pois em saber quem tem de ser economicamente protegido. Certamente não são os mais ricos. Mas também não serão apenas os mais pobres, sobretudo se a providência for essencialmente misericordiosa, caritativa e deficiente, como em grande parte dos casos tem sido. A sociedade está obrigada a descobrir o ponto certo do conceito de dignidade humana, o qual corresponderá ao conjunto das condições materiais suficientes que propiciam uma vida digna. E até este ponto o Estado tem de continuar a dar. E a partir deste ponto o Estado tem que tirar. Pelo menos e para já benefícios fiscais.
Que me digam: “Não é justo. Os meus filhos estão na escola privada e eu não entro, a não ser em caso de emergência, nas instituições e serviços do SNS. No entanto, pago 10.000 em impostos, contribuindo assim para sustentar serviços que eu não uso”. Eu respondo. Está bem. O que andamos agora a pagar de impostos serve também para saldar as dívidas contraídas para a construção dos heliportos da Madeira, o que, de um certo ponto de vista, é capaz de ser bem pior. E então? São assim os imperativos de justiça social. Ou pretendia-se que o povo da região autónoma assumisse a coisa sozinho?
Bem sei que me meti aqui por caminhos onde impera a complexidade das tecnicidades da economia, finanças e ciência fiscal onde os problemas são sempre dificeis de resolver e as soluções óbvias quase nunca são contempladas. Porque, afinal, acaba sempre por se provar de um modo ou de outro, que não são boas ou então que não valem a pena do ponto de vista económico-finaceiro. A verdade é que, independentemente de tudo o mais, estas soluções são é muito dificeis de implementar, requerendo muito trabalho, competência, honestidade e humanidade.