"ACHA QUE EU SOU BORDERLINE?"
Tita
05.02.16
Uma pessoa tem que ter cuidado quando diz que tem um terapeuta. Mais a mais se for um psiquiatra. Melhor dizendo, uma pessoa tem de ter cuidado quando diz que faz psicoterapia. Especialmente se for com um psiquiatra. Não vão os outros pensar que que há qualquer coisa de muito errado connosco. A nível mental, quero dizer.
Tenho um irmão que é um bocadinho imaturo e ansioso. E nem pensar em terapeutas. “Um gajo ainda sai de lá maluco”. Nada a fazer.
Devo dizer que, desde cedo, senti que tinha que aprender a atender às minhas emoções. Porque, em certas circunstâncias, sofria. Sofria porque havia algumas coisas que eu sentia e não compreendia.
Comecei por ir a uma psicóloga. E depois a outra. Não gostei. Principalmente porque eram muito opinativas. Não estava a aprender a lidar comigo. Estava a ter aulas de bom comportamento.
Até que tive um grave acidente de carro e foi preciso avaliar a eventual incapacidade psicológica que resultasse do mesmo. Foi aí que conheci o meu primeiro terapeuta. Que era psiquiatra. Digo o meu primeiro terapeuta porque com as outras duas eu não cheguei a aquecer lugar. E também porque agora tenho outra.
No início, ele era só médico da companhia de seguros. Mas, pouco depois, perguntou-me se não queria iniciar uma psicoterapia. Eu disse imediatamente que sim.
Então, fechou o processo com a companhia, tendo-me atribuído uma incapacidade de 0%. “Zero?”. Perguntei desiludida. “Mas isso vai afetar a minha indemnização”. E ele: “Preocupe-se com as suas coisas, que eu preocupo-me com as minhas”.
Durante 10 anos, trabalhámos as minhas emoções. A culpa, a insegurança… essas coisas. Eu tinha a mania de lhe perguntar se sofria de alguma doença mental. Do género, “acha que eu sou borderline?”. Só nestas alturas é que ele respondia às minhas perguntas. Invariavelmente dizia-me que não. “Então diga-me lá o que é que eu tenho”. Nunca me respondia. Aliás, ele nunca respondia às minhas perguntas que tinham a ver com coisas que eu haveria de descobrir por mim mesma com a ajuda dele. A verdade é que fartei-me de descobrir coisas dessas. E arrumei-me.
Entretanto, ele morreu. E eu, em lágrimas, pensei que precisava dele para partilhar sobre o assunto. Foi por isso que passei a visitar a colega dele. Vou lá de 15 em 15 dias. É uma continuação da terapia. Embora, hoje em dia, já não exista nada de estrutural para tratar. Só vou lá para despejar o saco e arrumar as ideias quando é preciso.