O AMOR
Tita
03.03.17
O meu pai está a morrer de amor. Por causa da minha mãe. A minha mãe deixou-o há quatro anos. Morreu. E ele nunca soube viver sem ela. Nos últimos tempos tinham fugido os dois para um refúgio onde eram felizes só os dois. O meu pai nunca traiu a minha mãe. Sempre soube respeitá-la. Até ao último momento. A minha mãe também nunca traiu o meu pai. Amavam-se. Amaram-se a vida toda. No início foi difícil porque era uma grande paixão. Discutiam imenso. E diziam um ao outro que se queriam deixar. E que, se não o faziam, era porque “tinham os miúdos pequenos”. A verdade é que ficaram juntos até ao fim. E depois, entretanto, descobriram formas de não discutirem tanto. Embora, no entanto, continuassem a discutir. Há amores assim. Que são para toda a vida.
Todos temos a mania de olhar para as pessoas de outra geração como se as pessoas de outra geração não soubessem amar. Como se fossem materialistas e comodistas, bem como escravas das conveniências. Como se as relações amorosas dessas pessoas estivessem destinadas exclusivamente à função da procriação e à acumulação conjunta de bens.
Mas as coisas não são assim. O amor não respeita a gerações. O amor também não se abate com a idade. O amor respeita a pessoas. Mas não a todas.