SUBIR O GERÊS
Tita
22.08.17
Há quem viva com medo. Medos, melhor dizendo. Conheci uma pessoa que tinha terror de baratas. Hoje lembrei-me de cobras. Do medo que tenho de cobras. Tenho tanto medo de cobras que, só para me castigar, sempre que ia ao zoo, visitava demoradamente o reptilário. A sensação vinha na forma de um tremor ligeiro nos membros e um friozinho na barriga.
Ontem subi o Gerês. Não deixa de ser um bocadinho assustador. Uma pessoa vai galgando aquelas curvas e parece que está a ser engolida por aquela densa vegetação. A certa altura a impressão é de que estamos irremediavelmente longe e tudo. A sorte é que há sempre gente a passar para nos lembrar que não. Procurei a cascata que tem um nome assinalado. Lá chegada a cascata estava seca. Não fiquei desiludida. De qualquer forma não iria nadar. Estava muita gente lá no topo. E eu, que tenho medo de cobras, prefiro não estar ao pé das pessoas se são muitas. Aquela energia de peregrino motorizado das pessoas irrita-me. Além disso, esta gente adora estar junta. Não se conhecem mas querem estar uns em cima dos outros. Fizeram-se poças na cascata seca. E lá estavam eles amontoados, ignorando-se, incomodando-se em volta delas e em cima das pedras. Também havia comida. As pessoas comiam despudoradamente.
No outro dia fui a uma piscina natural. Não estava ninguém para além de nós. Mas depois apareceu um treinador de cães pastores num jipe. Eram pastores alemães. O meu cão ficou irritadíssimo. O que é sempre uma maçada. Ele acredita que pode matar qualquer cão, albergando no peito esse desejo intimo e permanente. Depois o homem lá se foi embora. Se não fosse, não tinha ido à água. Ele meteu lá um cão enorme. Tipo isto aqui é tudo nosso. Depois de ele sair, a água estava um gelo. Sei porque fui mesmo lá para dentro. Só consegui dar dois mergulhos e não consegui evitar os respetivos gritos de dor quando vinha à tona.
Voltando ao assunto de Gerês, afirmo que não vale a pena andar lá de cavalo. Vê-se o mesmo que de carro e anda-se exatamente pelo mesmo sitio. A estrada encurvada. Também, aquilo é só escarpas e precipícios. Uma pessoa não se pode aventurar muito. Lembrei-me de que podem haver cobras no Gerês. É muito natural. Pensei que não gostaria nada de ter um encontro desses. Tenho medo de ser mordida e que a cobra, além do mais, se enrole nas minhas pernas.
Face a tudo isto é verdade que podia ter tido um ataque de agorafobia. Um a coisa que sucede quando a natureza é forte e a vida parece que, contraditoriamente, anda escondida. Mas não. Adorei ter subido o Gerês.