CORRIDAS DE TARTARUGAS
Tita
02.07.18
No tédio parece que estamos numa solitária viagem de comboio por uma longíssima planície sem casas e poucas árvores semeadas. O ritmo do tédio, neste caso, é marcado por aquele barulho repetitivo que o comboio faz a andar. Quando o tédio é no sofá ou numa cadeira de, por exemplo, um escritório, o tédio não tem ritmo marcado de fora. É só incapaz de ser distraído ou embalado.
O tédio significa pensamentos lentos como tartarugas gigantes a tentar correr. O tédio deixa os membros pesados. O tédio não passa se não mudarmos de sítio. Desde que não seja de comboio. Senão não passa mesmo. O tédio tem a ver com a obrigação de estar parado e não poder fazer outras coisas para além de corridas de tartarugas se fôssemos tartarugas. E tudo isto dá muito sono.
Há diferentes níveis de tédio. Há aquele que não passa mesmo quando se muda de sítio e não se vai de comboio. Este é o mais pesado e lento de todos. O mais profundo. É que o tédio tem a ver com a existência de impedimentos no pensar e no agir. Tem a ver com a obrigação de estar e de fazer. Ou, o que é pior, de estar e não fazer.
Quando a liberdade é verdadeiramente sentida, nunca há tédio.