"Ó SENHORA DOUTORA"
Tita
06.11.16
Isto é só um desabafo:
Porque me incumbiram disso, analisei uma questão que já tinha sido analisada por outrem. Como não concordei com os fundamentos e a proposta, fundamentei e propus de modo diametralmente oposto. Tudo foi levado à consideração superior e colheu o meu entendimento. Agora há que agir em conformidade. E ponto final.
Mas não. Não é ponto final porque outrem não se conforma. É já a terceira vez que me aparece no gabinete a dizer que não concorda comigo. E é já a terceira vez que eu tento entender porquê e não percebo. Já lhe disse: “se o senhor doutor não está de acordo, faça o que lhe parecer melhor”. Embora me pareça que ele nada pode fazer. Creio que, enquanto foi tempo, devia ter tratado de estudar melhor o assunto.
E é por nada poder fazer que ele não parece disposto a deixar-me em paz. Há ali uma questão que, suspeito, tem a ver com a vaidade. As pessoas estão a trabalhar e envolvem a sua cabeça como se aquilo fosse ali a casa delas. Confundem as emoções. No trabalho estamos para fazer o melhor que podemos e sabemos. Esta é a nossa obrigação. Quando discordei dele, não foi dele que discordei mas do argumentário que utilizou para no fim chegar a uma conclusão inadmissível. Legalmente inadmissível, quero dizer.
Com certeza que ninguém gosta de ver o seu trabalho posto em causa. Porém, se é uma desconsideração de cariz técnico-profissional e, sobretudo, se é merecida, o que fazer? Eu não trabalho para chatear ninguém nem para ser melhor do que os outros. Eu trabalho para ser melhor do que eu própria. Todos os dias.
Como é que as pessoas põem os seus egos à frente dos seus empenhamentos? O que é que aquela alma quer de mim agora? Sei, sinto, que está a desenvolver um sentimento negativo em relação à minha pessoa. Vê-se perfeitamente a raiva a levar-lhe o sangue ao rosto quando fala comigo. E depois há aquele atirar da testa para cima quando, por exemplo, diz: “senhora doutora não concordo com o ponto X do seu parecer porque nos hospitais blá, blá, blá”. E eu, a sorrir jovialmente, sempre olhando dentro dos olhos dele repondo: “senhor doutor, eu falei com blá, blá, blá”. E ele: “blá, blá, blá, está a mentir”. E eu disse-lhe várias coisas que não posso revelar, sendo certo que ele saiu do meu gabinete todo encarnado a prometer que vai analisar muito bem o que não analisou quando devia, tendo em vista fazer não sei muito bem o quê.
Para dizer a verdade, eu simpatizava com este outrem. Que chatice!